quinta-feira, 15 de julho de 2010

AS INTERMITÊNCIAS DA MORTE - JOSÉ SARAMAGO

José Saramago ficou mais conhecido depois que filmaram o livro Ensaio sobre a Cegueira. Mas ele tem muitas obras que merecem ser vistas. Esta daqui fala sobre um dia em que simplesmente as pessoas param de morrer. O que numa primeira vista parece ser um evento a ser comemorado aos poucos vai se tornando um problema. Para não perder o hábito, lá vai a transcrição da primeira página:
" No primeiro dia ninguém morreu. o facto, por absolutamente contrário às normas da vida, causou nos espíritos uma perturbação enorme, efeito em todos os aspectos justificado, basta que nos lembremos de que não havia notícia nos quarenta volumes da história universal, nem ao menos um caso para amostra, de ter alguma vez ocorrido fenómeno semelhante, passar-se um dia completo, com todas as suas pródigas vinte e quatro horas, contadas entre diurnas e nocturnas, matutinas e vespertinas, sem que tivesse sucedido um falecimento por doença, uma queda mortal, um suicídio levado a bom fim, nada de nada, pela palavra nada. Nem sequer um daqueles acidentes de automóvel tão frequente em ocasiões festivas, quando a alegre irresponsabilidade e o excesso de álcool se desafiam mutuamente nas estradas para decidir sobre quem vai conseguir chegar à morte em primeiro lugar. A passagem do ano não tinha deixado atrás de si o habitual e calamitoso regueiro de óbitos, como se a velha átropos da dentuça arreganhada tivesse resolvido embainhar a tesoura por um dia. sangue, porém, houve-o, e não pouco.
Desvairados, confusos, aflitos, dominando às custas as náuseas, os bombeiros extraiam da almágama dos destroços míseros corpos humanos que, de acordo com a lógica matemática das colisões, deveriam estar mortos e bem mortos, mas que, apesar da gravidade dos ferimentos e dos traumatismos sofridos, se mantinham vivos e assim eram transportados aos hospitais, ao som das dilacerantes sereias das ambulâncias. Nenhuma dessas pessoas morreria no caminho e todas iriam desmentir os mais pessimistas prognósticos médicos, Esse pobre diabo não tem remédio possível, nem valia a pena perder tempo a operá-lo, dizia o cirurgião à enfermeira enquanto esta lhe ajustava a máscara à cara."

Um comentário:

  1. Isso serviu para jogar na minha cara um livro que estou para ler há dois anos e meios. O cara já morreu e eu ainda não li...

    Mas um dia eu vou... rsrsrs

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